Da minha vida
Em alguns segundo meu olhar paralisou e fixou-se em um ponto cego. Tudo era escuro. Meus olhos estavam fechados. Chamei pelo seu nome e o ouvi ecoar em meus ouvidos. Não havia ninguém ali. Aos poucos senti alguém se aproximar. Assim como o cheiro de chuva que chega para anunciá-la, senti seus movimentos antes que você de fato aparecesse. Tudo se clareava aos poucos, o entardecer dava um tom alaranjado a sua pele. Percebi as cicatrizes no seu peito. Eu imaginei que estaria desse jeito. Os sinais de cansaço, as marcas pelo corpo. O que tinham feito com você? O que eu fui fazer?
Eu era a culpada. Perdi a razão e te deixei vulnerável, te arrisquei. Você nunca foi forte para ser pedra, nem leve para fazer-te aconchegante. Era vidro. Parecia bonito por fora, brilhava e refletia. Mas era tão delicado. Tão delicado. Eu sorria apesar da mágoa, só pensava em te fazer feliz e ter o sorriso retribuído. E então chorava pelo mais fraco dos motivos, já cansada de tanto fingir.
Caminhei ao meu encontro e pensei nas possibilidades. Curaria as cicatrizes, trancaria o peito, apagaria as marcas. Pontuaria o sofrimento para que pudesse retornar a mim. Desapareceria com os vestígios e, mesmo assim, sabia que ainda seria impossível tocar a alma, que já havia deixado os restos.
Não havia solução. Enquanto eu aceitava os fatos e as últimas lágrimas corriam pelo meu rosto diante do inalterável, senti a luz se apagar. No escuro era difícil encontrar o caminho de volta. Em meu desespero, pedi silenciosamente para que me devolvessem a luz. Talvez o problema tenha sido este. Na falta de voz, nem eu mesma me ouvi.