domingo, 26 de setembro de 2010

salva

A imagem me trouxe a lembrança.

Escolhi o jardim ao acaso, para ouvir músicas e o som da minha risada. Tudo começou com as flores. Brancas, rosas, amarelas. As cores me cercavam e me deixavam em paz. Me certifiquei do dia, ainda era hoje, mesmo sendo tarde. Sentei e cruzei as pernas a espera das sensações.

Em alguns segundos me ouvi sorrindo. Ao meu lado eles sorriam também. Sem motivos aparentes eles me mostravam a felicidade passageira. Instantes de alegria sem sentido. Compartilhei aquele momento. Meus pés sentiam o gramado, me livrei de minhas meias. Era felpudo, como um tapete.

Quis levantar, me mexer, dançar, mergulhar no silêncio. Mas havia música e ela invadia minha cabeça. Continuei sentada e esperei que a paisagem se acalmasse. Esperei o sorriso cessar. Os motivos continuavam não fazendo sentido para mim. Julguei a idéia inicial de estar ali, tudo acabaria logo e seria somente mais um momento.

Quis voltar para o plano inicial. Aproveitar a rotina de sempre, a mesma natureza que me trazia paz. Não tive forças para me sugerir outra idéia e continuei sentada. Em vez de me tranqüilizar, o ar pesava sobre mim e me sufocava a cada respiração. Minha cabeça tombava para os lados e por alguns segundo desacordei.

O pesadelo espreitava na mente para tomar conta de mim. E então aconteceu. O desespero de estar presa em outro lugar. Eu caminhava e me via cercada. Elas riam. As flores. A cerca. A felicidade delas me assustava. Suas cores embaralhavam minha vista e eu continuava perdida. Não consegui abrir os olhos, algo me impedia de ver o resto do caminho. Eu andava em círculos enquanto o mundo pendia e a gravidade me fazia cair. Me agarrei às paredes da sala do sonho enquanto tudo era arrastado. O gosto doce me deu nojo, me ofereciam a bebida delas. Era pólen, era mel.

Dei passos na realidade, que voltava aos poucos a ser um vislumbre. A cada imagem do espaço que eu ocupava minha alma se despedaçava. Tão ruim quanto o pesadelo era a realidade que me aguardava. Tristeza, pavor, insegurança, medo. E eu chorava. Compulsivamente. Sem que nada pudesse me acalmar. Senti toques, palavras. Mas ainda estava longe para voltar.

As lágrimas escorriam e eu estava deitada na cama. Ao abrir os olhos enxerguei a cabeceira e percebi que estava ali. O pesadelo tinha acabado e eu me encontrei despedaçada no fim da viagem. Enquanto meu coração batia, bombeava todo tipo de desgraça para minha mente. As memórias me desnortearam. Segura, perdi o rumo da minha vida. O pesadelo me fez tropeçar.

Tudo continuava ali. Eu estava sentada e as flores me rodeavam. Bastava de natureza. Acendi alguns cigarros enquanto recobrava a consciência. Mas algo estava faltando. Eu me faltava. Aquilo que levei tanto tempo reconstruindo, novamente estava exposto. Agora, sou obrigada a enterrar novamente o velho jardim e replantar as flores novas. Me forço a ver suas cores e planejar seu futuro. Meu futuro.

A viagem me afastou de mim. Volto aos poucos ao ponto inicial. E temo os jardins pelas lágrimas que me cobraram, pelo passado que me exigiram e pelas charadas que temo decifrar um dia.

*Takashi_Murakami_Killer_Pink

Um comentário:

oguardador disse...

Especial este texto. Especial como escreves os sentimentos que passam na tua cabeça. E coração.
Bjs